sábado, 23 de março de 2013

Os ultrarricos preferem privacidade

Garagem de magnata

Antes ignorado por arquitetos e decoradores, o estacionamento dos empreendimentos de luxo ganha status de área social e vira item de desejo

Por Fabiano MAZZEI para ISTOÉ Dinheiro
Já se foi o tempo em que ter uma ou mais vagas na garagem resumia o interesse em relação a esse espaço na hora de comprar um imóvel. No mercado imobiliário de alto padrão desta década, o espaço ganhou relevância, novas funções e pode ser o fiel da balança na decisão do futuro comprador. Por exemplo: que tal guardar o seu barco em uma marina bem debaixo da janela do seu quarto? Ou ainda levar o seu carro superesportivo italiano até o 50º andar e deixá-lo lá, em exposição, na sala de estar? Empreendimentos assim têm ganhado terreno no mercado. Da Ásia às Américas, passando pelo Brasil, a garagem se tornou a cereja do bolo.
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Na sala de estar: no edifício Hamilton Scotts, em Cingapura, a ousadia do projeto insere
os carros do morador no ambiente social
Em agosto de 2012, foi lançado o Hamilton Scotts, em Cingapura, que impressionou os bilionários do mundo inteiro com sua arquitetura arrojada e um elevador panorâmico exclusivo para os carros. Aqui a ideia não foi apenas levar os carros às alturas, mas o orgulho de seus donos também. O prédio tem 30 andares e 54 apartamentos de 300 m2, além das penthouses, com o dobro do tamanho, de duas ou quatro vagas no que foi rebatizado de “Ensuite sky garage”. Em Miami, há outro do gênero: o Porsche Design Tower, que, não à toa, foi batizado com o nome da montadora alemã. O edifício, em Sunny Isles, foi criado em parceria com o escritório de design da Porsche e com o incorporador americano Gil Dezer, que já construiu imóveis suntuosos para o bilionário Donald Trump.
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Sobe: Cristiano Piquet (detalhe) diz que a ideia do elevador de veículos no empreendimento Porsche Design Tower Miami,
em parceria com a montadora alemã, foi atrair quem ama carros - e adora privacidade
Trata-se de uma torre única e circular que tem no vão central um sistema de elevadores e plataformas para distribuir os carros pelas 132 residências em 57 andares. As coberturas duplex, a partir do 40º piso, têm direito a abrigar quatro veículos, que podem ficar tanto na sala de estar quanto no piso inferior, com um elevador privativo. Já o sexto andar do prédio – que ficará pronto em 2016 e tem 60% das unidades já comercializadas (a metade para brasileiros) – foi designado para ser uma área comum de exposição de carros especiais, onde os donos podem deixá-los para que os vizinhos morram de inveja.
“É um prédio focado para os amantes do automobilismo e, para estes, nada melhor do que ter seu próprio carro como item de decoração”, afirma o mineiro Cristiano Piquet, dono da Piquet Realty, agência que representa o empreendimento no Brasil. Mas não seria só a paixão pelas quatro rodas que justificaria o modismo das garagens elevadas. E o próprio Piquet su­gere a outra razão. “Os ultrarricos preferem privacidade”, diz. “Normalmente não gostam de ter que passar pelo lobby ou dividir elevadores com outras pessoas.” Com o acesso direto do carro para a casa, esse “incômodo” deixaria de existir.
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Barco em casa: projetado pelo escritório Slattery&Associates, o condomínio Marina Palms, em Miami,
oferece vaga na marina a apenas poucos passos do apartamento
VAGA MOLHADA Mas nem só de elevadores e carros a 50 metros de altura vive a nova estrela da arquitetura de luxo. Ainda em Miami, o condomínio Marina Palms YatchClub&Residences, no norte da cidade, inova ao oferecer aos seus futuros compradores uma garagem com vagas “molhadas”: uma marina para os donos de iates, com capacidade para 112 barcos de até 90 pés. Esse formato permite ao comprador observar o seu barco ancorado logo abaixo da janela do quarto. “É o primeiro condomínio na cidade em 20 anos a unir essas duas coisas”, diz Neil Firman, presidente do The Plaza Group, que desenvolve o empreendimento estimado em US$ 400 milhões. “É para quem busca um estilo de vida sofisticado, como ter o seu barco na porta de casa.”
Cada apartamento, de dois a quatro dormitórios, conta com serviço de mordomo, mobiliário italiano e paredes de vidro para apreciar a vista panorâmica da cidade. A ser entregue em 2015, o prédio tem apartamentos entre US$ 600 mil e US$ 1,6 milhão. E 25% das reservas, segundo o diretor de vendas do Marina Palms, Michael Intermoscia, foram feitas por brasileiros. “A maioria é para uso próprio, gente que passa as férias aqui”, afirma. No Brasil, quem também tem valorizado a garagem são os curitibanos. A capital paranaense, segundo pesquisa de 2010 do IBGE, é a que mais tem veículos de luxo por habitante. Pensando nisso, o empreiteiro João Carlos Perussolo, da construtora San Remo, entrega até o final do ano o Palazzo Lumini, um condomínio de alto padrão que traz no layout dos apartamentos piscina na varanda e adega particular para 500 garrafas.
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Colecionador ou aventureiro: no Palazzo Lumini, em Curitiba, o empreiteiro João Carlos Perussolo (detalhe)
idealizou perfis diferentes de garagem. Uma parece um lounge (acima). A outra tem até lava-rápido exclusivo
Mas o charme está no térreo e no subsolo. Além das vagas tradicionais (seis por apartamento, com sala para motorista, wi-fi e tomada para carros elétricos), há outros dois modelos de garagem, o Club e o Off Road. O primeiro atende os colecionadores de carros, com espaços climatizados que mais parecem galerias de arte: tem decoração assinada pelo designer Jayme Bernardo, iluminação focada no veículo e um lounge com sofás. No Off Road, há vagas individuais com paredes fechadas por telas e um lava-rápido para dar um trato nos jipões depois da trilha. “Sempre estive atento às novidades que podem tornar mais prática a vida do morador”, diz Perussolo. Por fim, fica a discussão. As garagens ganharam novas funções ou servem para escancarar o status de seus proprietários?
Para o arquiteto Leonardo Junqueira, levar o carro para dentro de casa é um diferencial para os muito ricos, mas que não necessariamente tem sua funcionalidade garantida. “Haveria elevadores suficientes para evitar um congestionamento de carros para subir ou descer? E se eles quebrarem?”, questiona. Segundo Junqueira, esta nova moda tem um certo toque exibicionista. Todavia, seu escritório tem recebido mais pedidos para revitalizar a garagem. “Recentemen­te, fiz uma para 20 carros, em uma casa de campo, com sofás e um bar. O dono queria receber os amigos que também são colecionadores como ele”, conta. “Um tipo de clube masculino, para falar de carro. Não só para mostrá-lo.”
 
Matéria original da Revista ISTOÉ Dinheiro

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